segunda-feira, 27 de abril de 2020

PLAYLIST! Jão


Meia-noite de domingo

Já é meia-noite.
Saúdo os da madrugada,
cigarro na boca pitando preto velho
Ah, que bonitas as almas!

Encontrei três sábios:
A primeira uma era uma fada,
A segunda um anjo divino
e a última uma bruxa transtornada.

Não falaram sobre mim,
Tive que adivinhar

Sou, fui, vou...
Já é meia noite,
Já posso tentar novamente,
Mas poxa! Queria eu lá as respostas

Procurar me cansa,
espere,
eu sei onde estão.

Encontrar me cansa,
mas se sei onde estão sei como encontrar.

Seguir em me cansa.

Agora sim, um acerto numa datilografia na meia-noite.

sexta-feira, 24 de abril de 2020

Poesia do tempo às avessas do poeta talvez sóbrio

Não consigo, não sem ajuda...
I gonna take that drug!
Which drug? Witch drug?
Não consigo, não alcanço tão longe
para o além mar.

Tudo que quero dizer é:
preciso delas. (assim mesmo, sem exclamações, apenas o ponto)
Eu sou o poeta, eu preciso,
Esse é o meu divino direito.
Entorpecer, entardecer, desfazer,
Escarnecer,
e escrever.

As palavras não surgem por si só,
Nenhum feitiço é lançado sem magia.
A minha acabou. (existiria uma exclamação invertida? veja, a língua já me foge)

O quê sou agora?
Bruxo ou charlatão?
Sou um mendigo mendicante por dentre as frestas?

Além, além, muito além...
No além do mar, da outra margem.
Magia profunda da aurora do tempo.

Mas não chego,


PLAYLIST! Aurora


quarta-feira, 25 de março de 2020

Escrito às pressas

Tenho que me apressar. Meus dedos tremem ao percorrer as teclas, os erros são tantos que só prolongam e prolongam...
Logo baterão à porta, quando fecho os olhos ouço passos pesados.
Olhei mais cedo pela janela e que vista: milhares e milhares, centenas e centenas. Os rebanhos marchavam rumo à grande colina. Os cavalos sagrados de fogo, o puro rebanho de nuvens, vacas e bois, tristes e taciturnos. Todos sabem, eles sabiam também o que faziam. Lentamente na procissão infinita subiam o grande cume, e caminhavam um passo além, um passo para o abismo. Mas não tinham medo. A queda era infinita, parecia infinita. Mas eu sei que há um chão no fundo. Tenho certeza. Se concentro-me o suficiente escuto o estrondo do corpo chocando-se abatido, despedaçando-se em sangue e carne contra o chão. Estou começando a alucinar, como posso de fato ouvir isso, há tanta distância?
Acho que fiquei surdo. Os passos desapareceram, mas devem estar próximos. O som das teclas, é um mero farfalhar de vento sob folhas numa árvore de verão. Por quê? Afinal o que é essa história? Por que escrevo-a com tanto desespero. Deve ser a angústia. Ela jorra preta por entre o pequenino espaço entre a unha e a carne de meus dedos. As teclas estão imundas. Apenas as acerto por tê-las memorizado e por um pouco de sorte, pois mal as enxergo. Logo não mais funcionarão, tomadas  de piche negro.
Ó grande Deus da Colina Infinita, Senhor de todos os abismos, por que afinal escrevo?
Basta, basta. Eu tentei. Não sei mais a distância dos passos. Mas vou sair agora, vou pela janela, descendo pela encanação, por um poucos metros. Mesmo que caia estarei bem, são menos de dois metros até o chão aqui...
Vou me juntar. Na grande procissão. Parece-me o mais certo afinal. Parece certo ter um final. Parece afinal com um final.
Obrigado, obrigado, obrigado, como me ensinaram - agradeço três vezes.
Obrigado, obrigado, obrigado.

domingo, 22 de março de 2020

Das origens do mau

Observai agora, veja com os olhos
Mire com atenção.

Não seja tolo, não há nada para se ver,
O deserto tomou o solo e o fogo
queima o céu.

O oásis está aqui.

A grande procissão dos mortos caminha lado a lado.
Os espíritos caem como estrelas cadentes.

Um arrepio na espinha,
Esperança? Sonho? Desespero?
O roçar do vento rouco em suas costas...

O que se vê afinal é isso,
as costas.


terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

A poesia dos mortos

O que os mortos escrevem no além túmulo?
Poesias sobre a noite escura e fria,
sobre o concreto rachado e flores murchas.

Ou seria a esperança da luz do dia,
a libertação das chagas?

O que escrevem os cadáveres?

Augúrios e maldições?
Orações benditas.

Contam o passar do tempo e
as batidas dos sinos ao longe

No sarau das almas vivas não há livro ou escrito algum.
Tudo que se faz é cantar,
Aclamando os que ainda virão.

terça-feira, 3 de dezembro de 2019

Ensinamentos

Embaixo da árvore florida,
O sábio dos sábios dizia:
Não deixai tu que a chama se apague.

E ensinou, ensinou, ensinou.
Nada aprendi.
Não me ensinaram o como.

Os por quês já eram então proibidos

Mas quando a tempestade perdurou,
ali acendi uma lamparina.






terça-feira, 26 de novembro de 2019

Cabeça de Porco

Invadiram as fronteiras,
os corpos se amontoavam.

O menino estava quase nu,
vestia os restos daquilo que um dia fora uma calça.

Encontrou entre uma pilha de cadáveres
a cabeça degolada de um porco.

Colocou sobre a cabeça,
troféu vitorioso.

E seguiu nos escombros,
O corpo de criança, a cabeça de besta,
A alma de morte.

No centro do território havia uma árvore.
As raízes eram profundas, até o inferno.
Os galhos subiam até alcançar as nuvens,
No sem fim do céu cinzento.

Então escalou.
Um homem e um porco na árvore do mundo.

PLAYLIST! Jão


segunda-feira, 25 de novembro de 2019

PLAYLIST! Aurora


Amém

Nunca quis construir uma casa.
No meu velório meus pais não pararam de chorar.
Apenas minha irmã parou, em alguns momentos.

Lá estava minha pequenina avó, em seus quase 90 anos,
curvada, chorava em silêncio e não sabia o que tinha ocorrido.

Por quê? Por que tantos choram?
Alguns amigos amados, presentes de Deus, dão os adeuses
Tios e primos choram também, uma pena, fiquei tão distante perto do fim

No fundo, sombras sorriem e choram ao mesmo tempo,
Aqueles que foram antes.

Obrigado, Senhor, por permitirem que a pequena Frida me veja no caixão,
meu corpo sem vida, que ela não compreende, abana o rabo e lambe com carinho.
Ah, mas que ironia, ela entendeu tudo, ela está alegre.
Eu estou alegre.

Então é isso que se chama vida.
Amém

Um pesadelo.

O medo cria, aumenta, nasce, já não sei dizer...
Ah, que vontade de parar o jogo.
O cheque-mate, ou
Atirar as peças para o lado.

Lá estava você,
e seus amigos.
Eles me odeiam, você se lembra?
Lembra-se da vez que falavam sobre mim?
E eu ouvia, ao seu lado, apenas.

A piada está sobre mim,
Não se preocupe.
A solidão ficará comigo na partilha final.

Quantos versos e estrofes compõem um soneto?
Esse é o soneto do eterno retorno,
Da despedida inaudita
E eu nem sei o que isso quer dizer.

Morrerei antes de chegar lá,
Estou morto, eu já fui.
Coleto agora as pétalas no chão
das flores que os parentes deixaram cair.